Major diz que mil pessoas participaram
da caminhada até a Sé. Manifestantes pedem retorno dos militares ao poder.
Manifestantes se reuniram em São Paulo
na tarde deste sábado (22), na Praça da República, para realizar uma nova
versão da "Marcha da Família com Deus pela Liberdade". O grupo queria
relembrar a marcha anticomunista e de apoio ao golpe militar realizada há 50
anos em 19 de março de 1964.
Em entrevista ao G1, o major da
PM Genivaldo, comandante da operação no local, disse que cerca de mil pessoas
participaram da Marcha da Família. O balanço foi feito cerca de 20 minutos
antes de o grupo chegar à Sé e encerrar o ato. Já o Centro de Operações da PM
diz que 500 pessoas participaram da manifestação.
Convocada pelo Facebook, o evento
tinha 2,1 mil confirmações na rede social. Para a dona de petshop Cristina
Peviani, de 51 anos, uma das organizadoras do evento, a nova Marcha reuniu
cerca de 3 mil participantes e cumpriu o objetivo de "lembrar que existe
família conservadora no Brasil".
Os manifestantes se concentraram na
Praça da República e seguiram até a Praça da Sé, repetindo o mesmo trajeto da
marcha original. Eles chegaram à praça por volta das 17h40, sem cruzar durante
o trajeto com a "Marcha Antifascista", convocada para criticar
aqueles que defendem a volta da ditadura.
A "Marcha da Família" foi
realizada poucos dias antes dos 50 anos do golpe militar, a serem completados
no dia 1º de abril. Os organizadores do evento pedem intervenção militar para
retirar do poder os "políticos corruptos, moralizar os poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário, promover valores morais e então convocar novas
eleições apenas para fichas limpas”.
Ibirapuera: Na Zona Sul, sete pessoas
atenderam convite feito nas redes sociais para se reunir no Obelisco do
Ibirapuera e levar uma carta ao aos militares pedindo a volta da ditadura. Eles
foram recebidos na sede do Comando do 2º Região Militar.
O evento foi convocado como uma versão
complementar da "Marcha da Família" convocada para o Centro da
cidade. Na sexta-feira, 410 pessoas tinham confirmados presença através do
Facebook. No total, 6,7 mil tinham sido convidados.
Princípio de tumulto: No centro, pouco
antes de a caminhada começar, um homem foi hostilizado pelos manifestantes. Aos
gritos de "Fora petista", ele foi retirado da concentração (veja
vídeo acima). Também na concentração, um fotógrafo independente foi agredido.
Outros fotógrafos que acompanhavam o ato disseram que ele foi atingido na
cabeça por manifestantes.
Entre os apoiadores da nova
"Marcha da Família", o analista de sistemas Lucas de Carvalho disse
ser a favor de uma revolução civil, à qual se seguiria uma intervenção militar.
"O Executivo, o Legislativo e o Judiciário já quebraram. A Constituição já
caiu de podre", disse. Carvalho e vários outros carregam bandeiras azuis.
Um vendedor de softwares de 23 anos
chamado Moisés afirmou que não pede uma ditadura militar, mas uma revolução em
defesa de Deus, da pátria e da família. No entanto, exaltou o golpe de 1964.
"Ninguém pediu o exército em 64. Na época teve uma intervenção lícita. A
revolução foi gloriosa", disse.
Os manifestantes cantaram o hino
nacional por volta das 16h. Depois, um dos organizadores, Bruno Toscano Franco,
de 41 anos, convocou os manifestantes a iniciarem caminhada em direção à Praça
da Sé. Eles caminham gritando "Fora PT", ou "não queremos eleição,
queremos intervenção".
Outro momento de tensão foi quando o
grupo passou diante do Metrô Anhangabaú e encontrou um grupo de pessoas com
camisas da banda de rock Mettalica. Houve um princípio de confusão com
manifestantes querendo cercar os roqueiros que se dirigiam ao Estádio do
Morumbi, para show da banda marcado para a noite do sábado. Os participantes da
marcha acharam que se tratavam de black blocks e chamaram o grupo de
"lixo". Antes de haver agressões, os manifestantes perceberam o erro.
Objetivos: Ao G1, Franco disse
que a marcha surgiu da necessidade de mostrar a insatisfação “com tanto
descaso, com tanta corrupção”. “A gente está cansado de viver num país em que a
educação e outros serviços básicos não são no padrão Fifa”, disse. Outra
motivação, segundo ele, é contar a história “verídica” do país e escondida nas
escolas, na opinião do grupo. "[O presidente] João Goulart estava agindo
de má fé contra o povo brasileiro, expropriando terras particulares, dizendo
que era reforma agrária”, defende.
Desta vez, a ameaça comunista no
Brasil é representada pelo PT. Franco cita o financiamento feito pelo BNDES
para a construção do porto de Mariel em Cuba como uma prova da aproximação do
governo Dilma Rousseff com os ideais comunistas. O porto foi inaugurado em janeiro
com a presença da presidente.
Para Franco, a intenção do governo
federal é transformar em um imenso bloco comunista a União de Nações
Sul-Americanas (Unasul). Atualmente, doze países contando o Brasil compõem esse
bloco que seria voltado à cooperação regional.
O fotógrafo atuou durante anos como
aviador e é filho e neto de militares. Ele critica ainda a ausência dos valores
da família e critica a defesa de criminosos por grupos de direitos humanos.
“Onde estão os valores da família nesse país? Acabei de ter uma filha e não
quero deixar esse país para a minha filha viver”, diz. Ele critica ainda a
criação de um kit gay para discutir homofobia nas escolas.
Saiba como foi a Marcha da Família
original, em 1964. A “Marcha da Família Com Deus pela Liberdade” ocorreu em 19
de março de 1964 e reuniu cerca de 500 mil pessoas. O ato começou na Praça da
República e terminou na Praça da Sé, percorrendo no caminho a Rua Barão de
Itapetininga, Praça Ramos de Azevedo, Viaduto do Chá, Praça do Patriarca e Rua
Direita. A marcha foi convocada como uma resposta ao comício que o presidente
João Goulart fez na Central do Brasil, no Rio de Janeiro, em 13 de março,
quando defendeu suas reformas de base para um público de 200 mil pessoas. Os
manifestantes eram contra o governo de João Goulart, pois temiam a implantação
de um regime comunista no Brasil, e favoráveis ao golpe militar.
Ela foi organizada pela União
Cívica Feminina, um grupo de mulheres com ligação com empresários paulistas.
Segundo a historiadora Heloísa Starling, da Comissão Nacional da Verdade, a
Marcha teve ainda apoio de setores da Igreja Católica e acabou se
tornando o modelo para manifestações que começaram a ocorrer em diversas outras
cidades.
Para a historiadora, a Marcha da
Família com Deus pela Liberdade foi a “face mais espetaculosa dos golpistas” em
1964. O ato e as manifestações em outras cidades que se seguiram
fizeram parte de uma grande “frente social” que teve ainda participações de
setores do comércio, imprensa e estudantes. “Era necessária essa mobilização
popular para legitimar o golpe”, segundo Heloísa.
Quase duas semanas depois da Marcha,
em 31 de março, o Exército mobiliza tropas e começa a tomada do poder. Em 11 de
abril, o general Castello Branco é nomeado o primeiro presidente do período de
ditadura, que durou 20 anos. O regime de exceção durou no país até o começo de
1985, quando o governo do general João Baptista de Oliveira Figueiredo foi
sucedido por José Sarney (PMDB).
À época, Sarney era vice de Tancredo
Neves, eleito pelo Colégio Eleitoral após o movimento Diretas Já. Durante a
ditadura, opositores do regime foram exilados, presos, torturados e
assassinados. Em 2012, a Comissão Nacional da Verdade foi instalada pela
presidente Dilma Rousseff para apurar as violações aos direitos humanos
cometidos entre 1946 e 1988, período que inclui a ditadura militar. A comissão
tem até 16 de dezembro de 2014 para concluir os trabalhos.
Fonte: Site O Globo 22/03/2014
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