Nas Eleições Gerais de 2014, a urna
eletrônica brasileira completará 18 anos. No dia 5 de outubro, os mais de 141
milhões de eleitores participarão da maior eleição informatizada do país e do
mundo, quando cerca de 530 mil urnas estarão disponíveis para votação.
Desenvolvida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para garantir ainda mais
segurança e transparência ao processo eleitoral – eliminando a intervenção
humana dos procedimentos de apuração e totalização dos resultados –, ao longo
destas quase duas décadas, a máquina informatizada de votar continua sendo
símbolo de credibilidade e de democracia.
Esse nível de informatização do
sistema eleitoral foi alcançado gradualmente, sempre passando pelo crivo da
segurança e da garantia do sigilo do voto, acompanhando a evolução tecnológica
mundial. Entretanto, a criação de um aparelho mecanizado para coletar votos é
um desejo antigo no país. O primeiro Código Eleitoral, de 1932, previa em seu
artigo 57 o “uso das máquinas de votar, regulado oportunamente pelo Tribunal
Superior (Eleitoral)”, devendo ser assegurado o sigilo do voto.
Na década de 1990, a urna eletrônica
tornou-se uma realidade, mas antes disso a Justiça Eleitoral já investia na sua
informatização.
Como tudo começou
O pontapé inicial para a criação do
sistema informatizado de votação foi dado com a consolidação do cadastro único
e automatizado de eleitores. Isso começou em 1985 e foi finalizado em 1986, na
gestão do ministro do TSE Néri da Silveira, quando o Brasil contava com cerca
de 70 milhões de eleitores. Antes, não havia um registro nacional, o que abria
espaço para fraudes no cadastro.
Em 1994, sob a Presidência do ministro
Sepúlveda Pertence, o TSE realizou pela primeira vez o processamento eletrônico
do resultado das eleições gerais daquele ano com recursos computacionais da
própria Justiça Eleitoral. “Quando assumi a Presidência do TSE, em 1993, demos
um passo significativo, que viabilizou, na gestão seguinte, a invenção e o
início da história da urna eletrônica sob a Presidência do ministro Carlos
Velloso. No meu biênio, montamos a infraestrutura necessária para que se
pudesse pensar em votação eletrônica, que foi a criação da rede nacional da
Justiça Eleitoral”, conta o ministro Pertence no programa Memórias da
Democracia, produzido pelo Tribunal.
O ministro recorda que essa rede
nacional da Justiça Eleitoral permitia transmitir a alguns centros regionais as
apurações de cada município. “Tanto que, ainda antes da urna eletrônica, dado o
trabalho da rede, a eleição presidencial de 1994, já às 10h, 11h da noite, nos
permitia anunciar o candidato eleito, que tinha alcançado a maioria absoluta”,
lembra.
Revolução
Mas “a grande revolução que foi o voto
eletrônico”, como classifica o ministro Sepúlveda Pertence, virou realidade a
partir de 1995. O presidente do TSE à época, ministro Carlos Velloso, explicou
no programa Memórias da Democracia que desde sempre o objetivo foi no sentido
de eliminar a fraude no processo eleitoral. “Pertence e eu assumimos um
compromisso: afastar a mão humana da apuração”, diz. E a solução, conta, foi
criar o voto eletrônico. “Uma urna eletrônica, um pequeno computador que
pudesse processar eletronicamente os votos, com rapidez, com a maior segurança,
propiciando, então, uma apuração rápida.”
Segundo Velloso, foi necessário fazer
“como que uma cruzada” pelo país para mostrar que seria possível informatizar o
voto.
“Havia uma descrença muito grande,
inclusive entre colegas”, destaca. O projeto começou a ser desenvolvido por um
“grupo de notáveis”, formado por desembargadores, juristas e funcionários da
Justiça Eleitoral para definir como deveria ser feita a coleta automática de
votos.
“O sucesso do trabalho da construção
da urna eletrônica brasileira foi todo traçado pela primeira comissão,
principalmente porque era uma comissão composta por pessoas que entendiam do
negócio Justiça Eleitoral brasileira”, registra o secretário de Tecnologia da
Informação do TSE à época, Paulo Camarão, convidado do Serviço Federal de
Processamento de Dados (Serpro) pelo ministro Carlos Velloso para conduzir os
trabalhos.
O atual secretário de Tecnologia da
Informação do TSE, Giuseppe Janino, lembra que, antes de 1996, testes eram
feitos com o personal computer (PC) por tribunais regionais com o objetivo de
informatizar a coleta de votos. “Só que isso evoluiu. Entendeu-se que o
computador não seria um mecanismo seguro o suficiente para ser adotado no
âmbito que se propunha, que seria [a votação eletrônica] em todo o país.”
Janino explica que o objetivo passou a
ser a construção de um equipamento baseado em computador, com tela, teclado e
CPU num mesmo bloco, e com vários requisitos de segurança já implementados.
“Não existia na época um equipamento desse tipo”, recorda.
Outras condições fundamentais eram que
a máquina fosse de fácil interação com o cidadão e totalmente fechada,
impedindo o acesso a suas memórias internas, algo que o computador na época não
oferecia. “Ao invés de se ter um teclado com várias opções, se teria algo muito
objetivo, que viabilizasse inclusive o voto do analfabeto. O teclado do
telefone foi justamente para possibilitar que o analfabeto e o deficiente
visual pudessem interagir com aquele dispositivo sem muita dificuldade”, lembra
Janino.
Assim, com base em premissas
determinadas pelo “grupo de notáveis”, foi designado um “grupo técnico” para
desenvolver o projeto básico da urna eletrônica. Para tanto, foram chamados
três engenheiros do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), um do
Exército, um da Aeronáutica (Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial
– DCTA), um da Marinha e um do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em
Telecomunicações (CPqD).
“A comissão técnica começou do zero,
foi trabalhando e construindo e fez o protótipo da urna. Quando a comissão
trabalhava, fui visitado por representantes de empresas estrangeiras oferecendo
urnas para nós. Eu dizia: não, vamos fazer uma urna tupiniquim, simples e
barata. E assim conseguimos”, afirma o ministro Velloso.
Giuseppe Janino também ressalta o fato
de a urna eletrônica ter sido criada para a realidade brasileira. “Foi uma
solução desenvolvida para a nossa necessidade, não foi uma solução importada.
Nós não fomos ao mercado adquirir alguma solução para a automatização do voto.
Desenvolvemos internamente o projeto. Essa solução tem o diferencial de servir
exatamente para as nossas necessidades e se encaixar exatamente na nossa
realidade”, destaca.
Antonio Esio Salgado, engenheiro do
Inpe que compôs o grupo técnico responsável por conceber o projeto da urna
eletrônica, registra que o “grupo de notáveis” recomendou que a coleta de votos
de forma eletrônica fosse feita considerando-se apenas os números dos
candidatos e partidos, com teclado e monitor disponíveis para que o eleitor
pudesse registrar seu voto e conferir visualmente se o candidato escolhido
correspondia ao que foi digitado no teclado.
Segundo Paulo Camarão, uma das
mudanças mais difíceis foi a adoção desse sistema numérico para candidatos.
“Não foi fácil isso não, porque muitos candidatos têm a marca deles em seus
nomes e na hora de votar eles abandonam esses nomes para se transformar em
números. [Mas] o Legislativo assimilou bem e concordou com essa mudança radical
no processo”, diz.
Primeira eleição informatizada
Em 1996, os votos de mais de 32
milhões de brasileiros, um terço do eleitorado da época, foram coletados e
totalizados por meio das mais de 70 mil urnas eletrônicas produzidas para
aquelas eleições. Participaram 57 cidades com mais de 200 mil eleitores, entre
elas, 26 capitais (o Distrito Federal não participou por não eleger prefeito).
“As urnas foram distribuídas a tempo e modo por aviões da Força Aérea
brasileira”, recorda Velloso.
Em artigo divulgado na imprensa no dia
29 de setembro de 1996, a uma semana do primeiro turno, o então presidente do
TSE, ministro Marco Aurélio, afirmou: “A Justiça Eleitoral tem razões de sobras
para acreditar que o eleitor não enfrentará dificuldades para votar no novo
sistema. A máquina desenvolvida é muito simples e foi submetida aos mais exaustivos
testes”.
Ele registrou ainda que do sucesso da
inovação dependia a extensão do voto informatizado à totalidade do eleitorado
brasileiro. “O primeiro passo está sendo dado. A Justiça Eleitoral cumpre o seu
papel, confiante de que tem o endosso de todas as forças políticas do país na
busca do objetivo maior: o aprimoramento constante da democracia”, concluiu o
ministro Marco Aurélio em seu artigo.
Cinco anos depois, as urnas
eletrônicas chegavam a todos os cantos do país, na primeira eleição totalmente
informatizada. Desde então, a Justiça Eleitoral vem ampliando o parque de urnas
eletrônicas para atender o crescimento do eleitorado brasileiro.
Giuseppe Janino avalia “como um
projeto de sucesso” a informatização do voto no país, principalmente pelo comprometimento
da Justiça Eleitoral com a melhoria contínua. “Enquanto tivermos esse
comprometimento, essa determinação na questão da melhoria contínua, e
aproveitando sempre o que a tecnologia nos propõe para introduzir essas
melhorias, no sustentáculo transparência e segurança, teremos um serviço de
excelência prestada para o cidadão brasileiro e uma experiência a ser
considerada para o mundo”.
Ele concluiu que “sempre há espaço
para avançar”, mas que isso deve ser feito com cautela. “As melhorias têm de
ser inseridas passando pelo crivo da segurança e da cultura adquira pelo
cidadão brasileiro.”
Fonte: Site TSE 20/06/2014
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