O governo bateu recorde de gastos em
2014 – ano marcado pelas eleições presidenciais – e, com isso, as contas
públicas do ano passado tiveram o pior resultado de toda a série histórica do
Tesouro Nacional.
Os dados divulgados nesta quinta-feira
(29) mostram que as contas do governo registraram o primeiro déficit primário
(receitas menos despesas, sem contar juros da dívida pública) em 18 anos, de R$
17,24 bilhões, pelo conceito "acima da linha", utilizado pelo
Tesouro.
Por outro cálculo, que considera a
variação da dívida líquida total e é conhecido como "abaixo da
linha", o déficit foi maior ainda: R$ 20,2 bilhões em 2014. Este método é
usado pelo Banco Central e serve de referência para as metas fiscais. O novo
secretário do Tesouro Nacional, Marcelo Saintive, declarou que o resultado do
ano passado "não é bom".
Em 2013, as contas haviam registrado
um superávit de R$ 76,99 bilhões, o equivalente a 1,6% do Produto Interno Bruto
(PIB), a soma de todas as riquezas produzidas no país. Até o momento, o pior
resultado havia sido registrado em 1997 (superávit de R$ 1,8 bilhão, ou 0,2% do
PIB).
[O
resultado] não é bom"
Marcelo Saintive, do Tesouro, sobre o
resultado das contas.
No ano passado, as contas públicas
registraram forte deterioração devido ao aumento de gastos públicos, à ajuda
para a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) e à queda real da
arrecadação – resultado do fraco nível de atividade da economia e das
desonerações de tributos anunciadas nos últimos anos pelo governo federal.
Meta fiscal:
No início de 2014, a equipe econômica
informou que o objetivo para as contas de todo o setor público (governo,
estados e municípios), em 2014, seria de um superávit de R$ 99 bilhões – o
equivalente a 1,9% do PIB, o mesmo percentual registrado em 2013. Deste total,
R$ 80,8 bilhões corresponderiam ao esforço que somente o governo central
estaria buscando em 2014.
Em novembro de 2014, porém, com o
fraco resultado das contas públicas, o governo enviou um projeto de lei ao
Congresso Nacional para alterar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e abandonar
a meta fiscal acertada no início do ano passado. O projeto, que admitia a
possibilidade de haver até mesmo déficit primário em 2014 (como de fato
aconteceu), provocou debates intensos no Legislativo, mas acabou sendo aprovado
pelos parlamentares.
Receitas, despesas e investimentos:
De acordo com dados do governo
federal, as receitas totais subiram 3,6% em todo ano passado, contra 2013, para
R$ 1,22 trilhão. O crescimento das receitas foi de R$ 42,93 bilhões no último
ano.
Ao mesmo tempo, as despesas totais
cresceram 12,8% em 2014, ou seja, mais que o triplo da expansão das receitas,
para R$ 1,03 trilhão. Neste caso, a elevação foi de R$ 116,99 bilhões em 2014.
Os gastos somente de custeio, por sua vez, avançaram bem mais no ano passado:
18,2%, para R$ 222 bilhões.
Na proporção com o PIB, ainda segundo
números da Secretaria do Tesouro Nacional, os gastos públicos bateram recorde
no ano passado ao somarem 21,3% do PIB. Foi a primeira vez em que as despesas
do governo superaram a marca dos 20% do PIB. O recorde anterior havia sido
registrado em 2013 (18,9% do PIB).
Já no caso dos investimentos, os
gastos somaram R$ 77,53 bilhões no ano de 2014, informou o Tesouro Nacional,
valor que representa um aumento de 22,6% frente a 2013 (R$ 63,22 bilhões).
Dividendos, concessões e CDE:
Segundo o governo, as receitas de
concessões recuaram fortemente no ano passado. De acordo com dados oficiais,
somaram R$ 7,92 bilhões em 2014, em comparação com R$ 22,07 bilhões no ano
anterior. A queda foi de R$ 14,15 bilhões. Os números da série histórica
mostram que o resultado de 2014 não foi ruim, mas sim que o valor registrado em
2013 foi excepcional.
Ao mesmo tempo, o governo recolheu um
pouco mais de dividendos (parcelas do lucro) das empresas estatais no ano
passado. De acordo com o Tesouro Nacional, os dividendos pagos pelas empresas
estatais ao Tesouro Nacional somaram R$ 18,93 bilhões em 2014, contra R$ 17,14
bilhões em 2013. O aumento foi de R$ 1,79 bilhão no último ano.
O governo informou ainda que subiram
os pagamentos feitos à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) em 2014.
Segundo o governo, foram pagos R$ 9,2 bilhões para a CDE em 2014, em comparação
com R$ 7,86 bilhões em 2013. Havia a previsão de um novo pagamento de R$ 9
bilhões em 2015, mas o governo já informou que não haverá mais esse repasse, o
que encarecerá ainda mais a conta de energia neste ano.
Meta fiscal de 2015:
A nova equipe econômica já anunciou,
no fim do ano passado, uma meta de superávit primário (economia feita para
pagar juros da dívida pública) de 1,2% do PIB, o equivalente a R$ 66,3 bilhões
para todo o setor público – que inclui também os estados, municípios e empresas
estatais.
Desse montante, R$ 55,3 bilhões
correspondem à meta para o governo e R$ 11 bilhões são uma estimativa para
estados e municípios.
O fraco resultado de 2014, com um
déficit primário da ordem de cerca de R$ 20 bilhões nas contas do governo,
tornam mais difícil o ajuste das contas públicas neste ano – uma vez que o
esforço terá de ser maior para atingir a meta pré-definida. Somente para as
contas do governo, o ajuste fiscal será de cerca de R$ 75 bilhões.
Medidas já anunciadas:
Nos últimos meses, o ministro da
Fazenda, Joaquim Levy, já anunciou uma série de medidas para tentar
reequilibrar as contas públicas. Entre elas estão a limitação de benefícios
sociais, como seguro-desemprego, auxílio-doença, abono salarial e pensão por
morte, que ainda têm de passar pelo crivo do Congresso Nacional.
Outra medida foi a alta do Imposto
sobre Produtos Industrializados (IPI) para automóveis, no início deste ano, e o
aumento de tributos sobre combustíveis, importados e operações de crédito. O
governo também já confirmou que não haverá mais repasses do governo ao setor
elétrico.
As medidas já anunciadas para 2015 já
superam a marca dos R$ 50 bilhões de ajuste fiscal, segundo números oficiais divulgados
pelo governo. Com a mudança dos benefícios sociais, o governo prevê um impacto
de R$ 18 bilhões a menos em gastos, ao mesmo tempo em que a ausência dos
repasses à CDE tem um impacto de R$ 9 bilhões.
Com a alta do IPI de automóveis, a
previsão é de aumentar a arrecadação em mais R$ 5 bilhões em 2015, enquanto
que, com a alta da tributação sobre combustíveis, importados e crédito, estão
previstos mais R$ 20 bilhões em arrecadação neste ano.
Analistas observam, porém, que a
limitação de benefícios sociais, cuja previsão é de impacto de R$ 18 bilhões
nas contas públicas neste ano, foi enviada ao Congresso Nacional por meio de
Medidas Provisórias. Com isso, ainda têm de passar pelo crivo do Legislativo.
As centrais sindicais pressionam contra as alterações.
Fonte: Site Globo.com 29/01/2015
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