Independentemente do desfecho da
novela de criação da Rede, Marina Silva só perdeu com o episódio.
Além de poder
ficar sem sua legenda, ela viu expostas contradições originadas na formação de
sua imagem pública.
Marina tenta capitalizar desde 2010 a fama de uma
"outsider" dada a gerenciar de forma horizontalizada, seja lá o que
for isso, o sonho dos milhões que a apoiaram.
Só que esta hagiografia, calcada na
narrativa da superação da miséria e no peculiar cruzamento entre ideologia
"povo da floresta" e populismo evangélico, escamoteia o fato de que
Marina é política de carteirinha.
A dinastia petista do Acre, de onde
vem, é tão viciada quanto qualquer outra. A forma envergonhada com a qual lida
com empresários revela mais sobre a tradicional simbiose público-privado da
política do que possam fazer crer mil palavras de ordem.
Por fim, ensaia o papel de salvadora
da pátria, "deus ex machina" da política. É personagem recorrente no
Brasil, como Jânio e Collor não nos deixam esquecer.
O processo de criação da Rede
explicita a dificuldade de convivência entre a verdadeira Marina e a musa
idealizada dos sonháticos. As regras são ridículas? São, mas é o que temos
hoje; cláusula de barreira é o nome da melhoria possível.
A Rede achou que seria possível montar
um partido a partir de 500 mil curtidas no Facebook, e que o direito divino
estaria a seu lado --a soberba de Marina em suas declarações é reveladora
disso. Nesse sentido, o parecer negativo do Ministério Público vai ao ponto quando
questiona a criação da sigla com fim exclusivo de eleger uma candidata.
Se a lei for levada ao pé da letra
pelo TSE, o fracasso empurrará Marina ou ao exílio orgulhoso ou à lambança de
fazer tudo o que prometia não fazer. Se for rasgada, a vitória a manchará com a
pecha de que apelou ao jeitinho como todo mundo. Sonhar é fácil. Despertar, nem
tanto.
Fonte:
Site Folha SP 02/10/2013
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